Então como está a correr a escola?
Era uma vez uma menina que nasceu muito rosadinha, de pele clara, sorriso pronto e olhos cor de mel. Era doce e sorridente, sempre pronta para abraços, brincadeiras com as coisas dos adultos e com uma ternura imensa pelos animais. Todos os animais a interessavam, mesmo as galinhas já adultas ela gostava de mimar.
A vida de criança corria leve e alegre, cheia do amor dos que a rodeavam e a menina era muito feliz. O tempo foi passando, a menina cresceu, veio o tempo de ir para a escola. A menina há muito esperava esse momento porque já conhecia o lugar e gostava de lá ir ter com as outras crianças. Nesses primeiros anos em que a brincadeira, os contos, os desenhos e as pinturas eram o que enchia os dias, e em que se ia aprendendo sem se dar conta disso, a menina sentia-se feliz. Nas alturas em que as regras eram mais rígidas e todos tinham de fazer isto ou aquilo ao mesmo tempo e durante um tempo determinado a menina não gostava, ela queria fazer quando sentia vontade e gostava de parar ou de continuar quando quisesse. Nesses dias ela vinha menos alegre para casa.
A menina viu que os meninos crescidos passavam muito tempo parados nas salas, que depois, em casa, continuavam parados durante muito tempo como se continuassem na escola, com os seus lápis, cadernos e livros. Achava estranho como ficavam tanto tempo a fazer a mesma coisa sem se aborrecerem ou cansarem, mas imaginava que era por serem mais crescidos.
Quando a menina e os seus amigos foram para as salas dos crescidos, onde se aprendia a ler e a fazer outras coisas importantes foi cheia de vontade, afinal iam passar a fazer mais coisas sozinhos e iam certamente ter mais liberdade para fazer o que queriam porque já eram mais capazes de tomar conta de si.
Quando começaram as tarefas de conhecer as letras, de saber como se formavam palavras, quando tinham que repetir muitas vezes o desenho das letras e dos números, e quando o professor falava, falava, tanto tempo que parecia uma melodia a encher o ar, a menina saia daquele lugar e ia para bem longe no seu pensamento. Ao princípio ninguém reparava, mas com o tempo o professor começou a notar que a menina, embora parecesse estar atenta e a fazer o que o lhe pediam, parecia que não estava lá na sala.
O professor chamava o seu nome e trazia-a de novo para as tarefas. A menina nunca se portava mal, nem se distraia em conversas, ao contrário dos seus colegas. Pensava que todos os meninos se cansavam assim das tarefas e de escutar o professor e que vagueavam nos seus pensamentos tal como ela.
Em casa, quando era a hora de fazer as tarefas da escola, tudo se passava da mesma forma e ela rapidamente se cansava, ficava no mesmo lugar, mas a viajar nos seus pensamentos. Demorava muito tempo até acabar tudo aquilo e cansava os adultos com a sua lentidão. Eles não compreendiam, a menina era muito inteligente, mas parecia que não queria trabalhar e os adultos ficavam arreliados com isso. Muitas vezes lhe diziam que se ela tivesse dificuldades em compreender, ou em lembrar-se do que aprendia eles podiam compreender, mas não querer fazer as coisas, isso não podia ser, ela tinha que fazer as tarefas.
A menina não queria que ninguém se arreliasse ou ficasse triste, tentava mais e mais fazer as coisas durante aquele tempo imenso que demoravam ao seu melhor ritmo, mas era mais forte do que ela. Tinha que parar muitas vezes, deixar o seu pensamento descansar e passear por outras coisas, senão não conseguia pensar em nada.
Diziam-lhe que se não parasse ia terminar mais cedo e podia brincar mais tempo, ela bem queria conseguir isso, mas era-lhe impossível.
Passou a observar como faziam os seus amigos e viu que muitos conseguiam ficar muito tempo sem parar a fazer as coisas e conseguiam melhores resultados. Ela também queria ter os bons resultados e procurava forçar-se mais e mais a estar mais tempo nas tarefas, mas…
Então a menina começou a sentir que era diferente, que o seu pensamento não era como o dos outros e que tinha algum defeito.
Todos procuraram ajudar, foi conversar com pessoas que sabiam muito sobre crianças e sobre como elas aprendem, fizeram testes e houve muitas e muitas conversas, mas na verdade não pareciam afinal saber assim tanto, porque não trouxeram nada de novo. A menina continuou a sentir as mesmas dificuldades e a lutar contras elas.
Muitas vezes a menina estranhava que os adultos tomassem a escola como o mais importante da vida de uma criança. Perguntavam sempre como corria a escola, o que andava a aprender, … Nunca perguntavam se tinha muitos amigos, se conseguia ajudar as pessoas, se andava a divertir-se muito, se já conseguia cozinhar, ou se compreendia melhor como vivem e sentem os gatos ou os cães. Parecia que a infinidade de coisas que ela tanto gostava e que a faziam mais feliz não eram importantes para os adultos.
A menina sempre guardou tempo e atenção para os que tinham dificuldades em aprender as coisas da escola, ou que não tinham jeito para resolver as coisas da vida que era preciso. Sempre conseguiu levar um pouco de alegria aos que estavam mais tristes, dar atenção aos mais tímidos.
Os anos passaram, a menina cresceu, percebeu que era diferente da maioria das pessoas na forma de aprender, de trabalhar e talvez até de extravasar as suas emoções. Aceitou que isso não era bom, nem mau, era apenas assim. Percebeu que o seu olhar conseguia chegar muito longe quando observava as pessoas e que lhes conseguia levar calor e alegria, que chegava facilmente ao seu sentir e que esse dom lhe trazia, também a ela, muita alegria.
Sempre que vinham crianças ao seu caminho conversava com elas sobre tudo e mais alguma coisa, mas nunca sobre a escola. Se as crianças falassem sobre a escola, claro que estava lá para as escutar, mas sempre procurando que os seus mundos não se confinassem nela.