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Contos por contar

Contos por contar

08
Out22

Menina, senhora, fada, bruxa, princesa ou rainha???

Desafio Arte e Inspiração 2.0 - semana #4

Cristina Aveiro

The Lady off Shalott de John William Waterhouse.jp

The Lady off Shalott de John William Waterhouse

Há muito, muito tempo, quando as noites eram escuras como breu porque apenas havia archotes para andar na escuridão, as gentes e a natureza ainda estavam unidas e tudo era muito diferente.

Nesses tempos quando o sol se ia deitar e escurecia, quase todos recolhiam às suas casas pequenas e simples, onde havia uma fogueira para dar luz, calor e cozinhar o que houvesse para a ceia. Quase todas as pessoas viviam em pequenos lugares, com apenas algumas casas, mas distantes umas das outras porque à volta das casas estavam os campos onde as pessoas cultivavam os seus alimentos. Nesse tempo distante não havia lojas ou lugares onde comprar. As pessoas trocavam entre si as coisas que precisavam, se tinham ovos podiam trocar por um pouco de leite com o vizinho que tinha cabras ou vacas, ou se tinham lã podiam trocar por sementes ou outra coisa que precisassem.

Numa dessas casas de pedra, perto do rio e da floresta, vivia uma família com seis rapazes e duas meninas e os seus pais. Tinham animais, três vacas, onze galinhas, dez cabras, sete ovelhas, dois porcos e um burro. Havia sempre muito trabalho para todos, a sua vida era passada a cultivar os campos, a tratar dos animais, enfim a manter o suficiente para poderem comer e aquecer-se todos os dias. As crianças mais velhas tomavam conta das mais novas e ajudam em todas as tarefas.

Os banhos e a lavagem das poucas roupas que tinham fazia-se no rio, fosse verão ou inverno. Os pequenos gostavam de ir ao rio a banhos, era um momento em que havia sempre brincadeiras, risos e gargalhadas. Quando iam secando ao sol e ao vento dois dos irmãos gostavam de se afastar um pouco caminhando ao longo das margens, procuravam uma zona de lagoa onde o rio era mais tranquilo, mas que ficava longe. Eles pensavam que esse lugar existia, mas não tinham a certeza, afinal tinham apenas escutado os irmãos mais velhos e falar sobre a lagoa, mas por vezes eles pregavam-lhes partidas e falavam de coisas que não existiam.

Sempre que podiam iam-se afastando um pouco mais, e mais, até que num dia se afastaram tanto que começou a escurecer e como o rio se tinha separado em dois já nem sabiam bem como regressar a casa.

Aninharam-se debaixo de uns arbustos grandes e espinhosos para ficarem protegidos quando viesse a noite e decidiram descansar. Os sons da floresta eram seus conhecidos, mas começaram a escutar um som diferente, parecia algo a deslizar nas águas do rio, que naquela zona já eram calmas. Começou por aparecer a ponta de um barco grande e preto com uma forma dourada no cimo, depois viram velas pousadas sobre o barco, lindas, perfeitas, brancas. Aos poucos foram aparecendo as mantas mais belas e coloridas que jamais tinham visto, pareciam pintadas com as papoilas e os malmequeres do campo. Por fim apareceu a menina, ou senhora, ou fada, bruxa, princesa ou rainha, mais luminosa e bela que alguma vez podiam ter imaginado. Vestia de branco com vestes longas, tinha cabelos longos e soltos de uma cor quase vermelha e tinha bordados brilhantes e dourados nas suas roupas.

Os rapazes nem respiravam, nem se mexiam, estavam cheios de medo, e ao mesmo tempo com uma enorme vontade de ver tudo o que estava à sua frente e que nunca tinham visto. O barco continuou rio abaixo e a mulher continuou a olhar o rio de frente, bem direita e só, a navegar o barco.

Quando desapareceu, os rapazes ainda ficaram um bocado sem se mexer nem falar, parecia que tinham ficado transformados em estátuas. Aos poucos começaram a falar baixinho um com o outro, a partilhar o que tinham sentido, o medo, o encanto, o espanto…

Veio a noite e ali dormiram, no dia seguinte retomaram o caminho para regressar a casa. Ainda estavam como que enfeitiçados pelo que tinham visto, não conseguiam falar de outra coisa. Estavam preocupados porque sabiam que os pais iam estar zangados com eles por se terem afastado. Estavam também sem saber o que fazer sobre o que tinham visto, se deviam contar (mas talvez ninguém fosse acreditar), se deviam guardar para eles (mas os pais acabavam sempre por descobrir tudo o que eles queriam esconder).

Todo o caminho pensaram e repensaram, e continuaram sem saber o que fazer.

E tu, como farias?

 

Todas as quartas-feiras eu e a Fátima Bento, a Ana D., a Ana de Deus, a Ana Mestre, a bii yue, a Célia, a Charneca Em Flor, , a Imsilva, o João-Afonso Machado, o José da Xã, a Luísa De Sousa, a Maria, a Maria Araújo, a Mia, a Olga, a Peixe Frito, a Sam ao Luar, e SetePartidas publicamos um texto relativo ao quadro da semana, que é apresentado todas as sextas de manhã.

 

  

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