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Contos por contar

Contos por contar

21
Set22

A menina de sua Mãe!

Desafio Arte e Inspiração 2.0 - semana #2

Cristina Aveiro

Young Mother Sewing-Mary Cassatt-1900.jpg

Sempre fora assim, tinham-se uma à outra, parecia que eram quase um único ser. A menina adorava a sua mãe, os dias eram passados com ela em pleno. Quando a mãe cuidava da casa a menina seguia os seus passos, quando ia lavar a roupa ao rio acompanhava a mãe, no início ficava sentada numa bacia de zinco, depois já ficava sentada na margem, ou a chapinhar no rio quando era Verão. Quando já era mais crescida até gostava de tentar apanhar peixinhos que depois levava para casa, mas que para surpresa sua acabavam por morrer, tal como a mãe já antes tinha vaticinado, mas que a menina não conseguia acreditar.

O pai adorava a menina e a mãe, mas estava pouco tempo em casa, tinha sempre de ir a muitos sítios no seu carro verde cheio de tecidos e outras coisas para vender às pessoas que precisavam. Assim, a maior parte do tempo da menina passava-se na companhia da sua mãe.

A menina adorava o tempo que a mãe passava naquele lugar da casa a que chamavam casa da costura, onde havia uma bela máquina Singer, onde a mãe costurava longas horas sacas do pão, a partir de tecidos cortados que cheiravam muito bem, cheiravam a algodão, num cheiro quente e intenso que quase parecia o do pão quente que iriam albergar.

A menina gostava de tudo naquele ritual, desde o som ritmado da máquina de costura a galope tranquilo, ao cheiro doce das sacas que pareciam já ter o pão lá dentro, até às tarefas que lhe deixavam fazer. A menina podia virar do avesso as sacas depois de terem sido cozidas uma primeira vez. A mãe dizia sempre que ela tinha ajudado muito e que se notava como estava crescida. Mais tarde, quando já conseguia controlar melhor os movimentos, a mãe deixava-a colocar a fita de nastro nas sacas usando um alfinete de ama, que empurrado e puxando fazia a fita chegar ao outro lado e depois dava o nó para ficar fechada a fita.

Quando começava a ficar cansada, a menina deitava-se sobre o monte das sacas já feitas e a mãe continuava a cozer sem parar e a menina, embalada pelo som amigo e tranquilo da máquina de costura começava a fechar um pouco os olhos e quando dava conta já tinha adormecido.

Acordava quando o som da máquina parava e ficava tonta e estremunhada, procurando a mãe e resmungando porque o sol já se tinha ido embora e a menina não o tinha visto partir.

Oh! Como a casa da costura era um lugar mágico! Oh! Como nada de mal podia acontecer por ali! Durante o resto da sua vida, a menina, sempre que se sentia em água turbulentas regressava à casa da costura e ali ficava com a sua mãe e nada no mundo era mau, perigoso ou triste. Ali tudo era calmo, cheio de amor e tranquilidade para todo o sempre!

 

 

PS: Quando vi esta pintura pela primeira vez no MOMA, nem sabia que tinha havido impressionistas americanos, tinha ido lá para ver os nossos mestres europeus. Tive de trazer um poster do quadro para oferecer à minha mãe. Muitos anos mais tarde, a minha mãe pode ir ver o mesmo quadro ao MOMA e trouxe três reproduções deste quadro e ofereceu uma a cada uma das suas três filhas. A máquina de costura e costurar sempre foram uma companhia da minha mãe e das meninas que foram nascendo e mesmo os rapazes (netos) sentem algum fascínio por costurar com a avó.

 

Todas as quartas-feiras eu e a Fátima Bento, a Ana D., a Ana de Deus, a Ana Mestre, a bii yue, a Célia, a Charneca Em Flor, , a Imsilva, o João-Afonso Machado, o José da Xã, a Luísa De Sousa, a Maria, a Maria Araújo, a Mia, a Olga, a Peixe Frito, a Sam ao Luar, e SetePartidas publicamos um texto relativo ao quadro da semana, que é apresentado todas as sextas de manhã.

Se se quiser juntar a nós, esteja à vontade, diga apenas que o vai fazer!

(o desafio termina na última semana de novembro )

14
Nov20

A Maria Birras & Alegrias

Cristina Aveiro

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Era uma vez uma menina pequenina de pele clara, carinha redonda, cabelo aos caracóis e uns olhos verde-acinzentados que só de olhar faziam mil perguntas. A menina chamava-se Maria e gostava muito de ver e entender tudo o que estava à sua volta. A sua mãe costumava dizer que a Maria estava sempre com as anteninhas no ar porque era muito atenta e queria saber as coisas, como se fazia, porque era assim, como se chamava isto e aquilo, como funcionava, … Os adultos ficavam encantados por poder falar de tantas coisas  para lhe responder às perguntas, muitas vezes ficavam algum tempo a pensar antes de lhe responderem.

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Chegou um tempo em que começaram a vir umas nuvens cheias de birras que pareciam chover em cima da Maria. Na hora do banho, quando a mãe lhe dizia que era para ir para a banheira, levantavam-se nuvens muito grandes e escuras. A menina desatava a chorar e dizia que não, não queria tomar banho, tomar banho era uma nojeira, não ia, … A mãe parecia que não ouvia, nem via a birra e com calma ia despindo a menina e dizendo que tinha que ser, que era preciso, que a água estava quentinha, que a Maria gostava de brincar com os brinquedos do banho,… mas a menina continuava na birra. Mesmo depois de entrar na água ainda continuava por mais um bocadinho. No banho parecia que a nuvem das birras tinha desaparecido, só voltava um bocadinho quando era para lavar a cabeça. Depois de estar toda lavadinha a mãe deixava-a ficar a brincar com o patinho amarelo, com o termómetro tartaruga, a râ nadadora e os brinquedos da praia que também tinham lugar nas brincadeiras da banheira.

Quando a água já estava a arrefecer a mãe dizia que o banho tinha acabado e era altura de sair, vinha novamente uma nuvem cheiinha de birras de tamanho gigante. Não, não queria sair do banho, queria ficar, não a água não estava a ficar fria, e claro era birra com choro, boca bem aberta e lágrimas a cair na água do banho.

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A mãe dizia-lhe então, mas tu nem querias vir para o banho, como é que agora não queres sair. A menina parecia nem ouvir, penso que não ouvia mesmo, é que as nuvens das birras fazem tanto barulho que ninguém se ouve quando elas estão por aí.

Com muita paciência, a toalha de banho especial com o capuz bordado com as baleias, muito mimo e creme no corpo para cuidar da pele delicada, a Maria lá ia acalmando. No fim de estar vestida era hora de ir jantar…

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Já se está mesmo a ver que as nuvens iam voltar. E voltavam mesmo, não queria ir para a mesa, não tinha fome, não gostava daquela comida, … Então o pai dizia-lhe que a ia ajudar e ao mesmo tempo lhe ia contar uma história e começava a fazer palhaçadas, então as nuvens começavam a desaparecer de novo. No fim do jantar às vezes o pai perguntava à mãe se podia ser um icecream e a menina dizia logo que sim.

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Os pais costumavam dizer alguns segredinhos entre eles em inglês, mas havia algumas palavras mágicas que a Maria já conhecia e icecream era uma delas.

Um pouco de brincadeira depois do jantar e lá chegava aquela hora de que a Maria nunca tinha gostado. A hora de ir para a cama! Claro que voltavam as nuvens, claro que não tinha sono, ainda queria brincar mais, não queria ir para a cama, só mais um bocadinho, … e pronto lá vinham os pingos da birra, lágrimas pela carinha abaixo.

Já na cama, ainda havia tempo para um  bocadinho de brincadeira com a irmã pequenina e voltava a alegria de novo.

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Quando o pai ou a mãe vinham até à sua cama, e se sentavam ou deitavam ao seu lado, lá chegava a hora de ler uma história. Muitas vezes a menina escolhia a mesma do dia anterior e ouvia-a dias seguidos e ficava feliz. A menina queria sempre mais histórias e muitas vezes a mãe dizia que estava cansada de ler e que ia contar uma história inventada. Qual é o animal da história hoje?- perguntava a mãe. A menina escolhia. Então a mãe começava,...

Era uma vez um coelhinho pequeno que não queria ficar na toca e queria ir com a mãe à horta. A mãe disse-lhe que não podia ser porque era longe e podia ser perigoso e por isso tinha de ficar. O coelhinho começou a bater com as patas no chão com força e começou a chiar fazendo muito barulho e uma grande … birra. E a história continuava.

A menina ouvia, ficava um pouco pensativa e dizia à mãe, eu já não quero fazer mais birras, mas às vezes não consigo. A mãe abraçava-a e dizia-lhe que ia conseguir, quanto mais crescia mais forte ia ser.

A menina dizia que nunca mais queria que a Maria Birras voltasse porque essa não era ela, ela era só a Maria.

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